Comitê técnico do governo para o tema teve participação do ISPN pontuando entraves e oportunidades para regularizar a produção da agricultura familiar e de povos e comunidades tradicionais.
“Há enormes desafios para a comercialização pública de produtos da agricultura familiar e da biodiversidade que podem implicar em ameaça aos modos de vida de comunidades tradicionais”, disse o coordenador de programa do ISPN, Rodrigo Noleto, na II Reunião do Comitê Técnico de Regularização para as Compras da Agricultura Familiar (CAISAN), realizada na manhã de hoje, no Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). Com foco em soluções para viabilizar a venda de produtos de origem animal da agroindústria de pequeno porte no âmbito público, como o PNAE, o MDS instaurou o comitê, que reúne diferentes órgãos do governo, desde o ano passado para adequar a regularização às necessidades dos produtores familiares.
Por meio de uma retrospectiva da legislação sanitária para a regularização de produtos de origem animal de pequenas agroindústrias, Rodrigo relembrou que, com pressão da sociedade civil, já houve avanços nesse sentido, mas que ainda não foi suficiente para atingir o grande passivo da produção comunitária, familiar e artesanal. O decreto 7.216, de 2010, por exemplo, aborda que o Sistema Único de Atenção à Sanidade Agropecuária “respeitará as especificidades regionais de produtos e das diferentes escalas de produção, incluindo a agroindústria rural de pequeno porte.
Segundo Noleto, a desinformação sobre procedimentos burocráticos e funcionamento da agroindústria, o pouco investimento, o baixo conteúdo tecnológico, a burocracia excessiva, a precariedade de transporte e a exigências de grandes estruturas para beneficiamentos são entraves graves que prejudicam a regularização, por consequência a comercialização dos produtores. “As quebradeiras de coco ainda fazem o trabalho de forma artesanal e prejudicam sua saúde por falta de investimento em tecnologias nesse âmbito”, pontuou.
Além de repensar esses entraves, para Rodrigo, é preciso quebrar o mito sobre “quanto mais industrializado, mais seguro para a saúde”. Tratar a pequena agroindústria igual ao grande produtor agrícola não atende às necessidades da agricultura familiar e dos povos e comunidades tradicionais, o que traz consequências graves para esse público como: homogeneização dos produtos, ameaça aos modos de vida tradicional e a cultura dos povos, a falta de acesso ao mercado para a venda dos produtos, risco de extinção das feiras populares, desvalorização das espécies nativas e domínio das grandes corporações.
Como perspectivas e orientações para a maior horizontalidade das normas sanitárias, Noleto coloca a urgência em se buscar um equilíbrio entre saúde e segurança alimentar, valorizando as práticas locais e tradicionais, considerando a biodiversidade e a diversidade sociocultural. “O autoconsumo, por exemplo, precisa ser regulamentado. Muitas populações indígenas produzem e consomem dentro das próprias comunidades, mas aí, para as escolas indígenas chegam os produtos embutidos, de fora, que não dialogam com suas vivências culturais” esclarece.
A participação do ISPN demarcou a perspectiva que prioriza os anseios das famílias agricultoras e dos povos e comunidades tradicionais sobre as normas sanitárias para que os objetivos que o próprio poder público coloca sejam alcançados. “Temos a necessidade de aumentar as vendas, principalmente de proteínas, no âmbito do PNAE [Programa Nacional de Alimentação Escolar], então, precisamos entender quais medidas precisamos para que a regularização sanitária se adeque a isso, e o conhecimento do ISPN é útil nesse momento”, comentou a secretária executiva da CAISAN, Carmem Priscila Bocchi.
A próxima reunião do CAISAN está prevista para julho e contará, além dos integrantes de hoje, com a presença do PNAE, do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e do Ministério Público.
Guia de Elaboração de Projetos de Agroindústrias Comunitárias
No início desse ano, o ISPN lançou a segunda edição do Guia de Elaboração de Projetos de Agroindústrias Comunitárias. A publicação é dirigida às organizações sociais e produtivas, profissionais sanitários, técnicos em edificações e todos aqueles que necessitam de apoio para a regularização sanitária de unidades de beneficiamento, que estejam orientadas para o mercado formal. O material, também colocado em discussão na manhã de hoje no MDS, poderá subsidiar as reflexões sobre as normas sanitárias para os produtos da agroindústria de pequeno porte. Para acessar a publicação, clique aqui.